O que a blogosfera tem de melhor é a sua diversidade. Vejam bem este grupo de blogues, todos diferentes mas igualmente excelentes: a doce Ofeliazinha, o cinéfilo Matiné, o generalista Caso Bicudo e (mais uma vez nunca é demais!) a nossa querida Blue Shell.
2005-03-28
Mister Pink
O meu Reservoir Dog preferido é o Mister Pink (Steve Buscemi), porque é o mais cool (no seu duplo sentido de porreiro e frio) de todos eles. À primeira vista não parece, mas é mesmo. Não só porque ele é o responsável por alguns dos momentos mais inspirados do filme, mas também porque possui um pragmatismo, esperteza e capacidade de sobrevivência dignos de um rato (aliás, se olharmos bem, há qualquer coisa de rato na fisionomia de Buscemi…). No meio da confusão que se segue ao roubo gorado, este Mr Pink é o único assaltante suficientemente sereno para esconder o saque em lugar seguro, acalmar os colegas mais exaltados e perceber que há um traidor entre eles. E quando ele se recusa a dar uma gorjeta à empregada do café, não o faz por mesquinhez ou forretice, mas sim em coerência com esse sentido prático da vida. Qualquer pessoa que tenha atravessado tempos de penúria, compreende bem o gesto de Mister Pink e a sua argumentação. O próprio Quentin Tarantino, que fez dele uma espécie de alter-ego, já defendeu publicamente a sua personagem: «esse foi o meu credo durante muito tempo, porque quando eu ganhava o ordenado mínimo, ninguém me dava gorjetas. Eu desempenhava uma profissão que a sociedade não considerava merecedora de gorjetas». A simpatia do argumentista para com Mister Pink é manifesta: ele não só será o único protagonista poupado à matança, como o seu profissionalismo acabará por ser generosamente recompensado com uma mala cheia de diamantes.
2005-03-22
Jornal de Letras
O excelente Jornal de Letras celebrou por estes dias vinte e cinco anos de dedicação à cultura, à inteligência e ao bom gosto. Ao director José Carlos de Vasconcelos e a todos os seus colaboradores, os nossos parabéns!
2005-03-21
Like a Virgin
Um dos momentos mais reverenciados de Cães Danados (1992) é aquele em que os oito gatunos estão à mesa do café e discutem as implicações filosóficas da canção Like a Virgin, da Madonna. De um lado, Mr Blonde (Michael Madsen), um romântico da velha escola, segue a interpretação mais ortodoxa e fala de uma jovem frágil que conhece um homem sensível e experimenta o amor pela primeira vez. Do outro, Mr Brown (Quentin Tarantino) sugere que a letra da canção é na realidade uma metáfora para pilas grandes:
«Let me tell ya what ‘Like a Virgin’’s about. It’s about some cooze who’s a regular fuck machine. I mean, all the time, morning, day, night, afternoon, dick, dick, dick, dick, dick, dick, dick, dick, dick, dick, dick. […] Then one day she meet a John Holmes motherfucker, and it’s like, whoa baby. This mother fucker’s like Charles Bronson in ‘The Great escape’. He’s diggin’ tunnels. Now she’s getting’ this serious dick action, she’s feelin’ something she ain’t felt since forever. Pain. […] It hurts. It hurts her. It shouldn’t hurt. Her pussy should be Bubble-Yum by now. But when this cat fucks her, it hurts. It hurts like the first time. The pain is reminding a fuck machine what it was like to be a virgin. Hence, ‘Like a Virgin’.»
Madonna é uma fã do filme e reagiu à provocação com todo o fair play e simpatia – o que não deixa de ser um pouco surpreendente, se considerarmos que ela é descrita como uma verdadeira «máquina de sexo». Quando todos os olhares do público se viraram para ela numa projecção do filme a que assistiu, Madonna limitou-se a sorrir e a encolher os ombros. Mais tarde, a diva conheceu Tarantino pessoalmente e contou-lhe qual era o verdadeiro sentido da sua canção: «ela fala-nos de uma miúda que atravessou dificuldades e encontra finalmente um homem que a ama». Os dois artistas ficaram amigos e quando a cantora ofereceu ao cineasta um exemplar do livro Erotica, escreveu a seguinte dedicatória: «Para o Quentin. Não é sobre pilas, é sobre o amor. Madonna.»
Chucky
O boneco Chucky está de volta e o seu novo filme fala-nos, ao que parece, das suas tentativas para gerar um filho através da inseminação artificial. O trailer já anda aí à solta e é uma pérola de descaramento. Só para anglófilos: «Get a load of Chucky!»
Elipses
A elipse é o processo narrativo que se caracteriza pela supressão de elementos da acção para realçar outros e tem no cinema, meio que se rege pela economia e necessidade de síntese, um campo de aplicação privilegiado. A montagem, dividindo o tempo e o espaço narrativos em diversas partes (planos), veio facilitar essa operação e quanto mais elíptico for um filme, mais longe estará de uma estética literária ou teatral. O cinema está repleto de exemplos memoráveis de elipses. O que há de tão apetecível e sedutor nelas é a sua implicação do espectador: as elipses são lacunas, espaços vazios, pequenas ilhotas de liberdade semiótica que solicitam uma pluralidade de leituras. O realizador já não afirma, apenas sugere; não mostra a totalidade das coisas, mas apenas a sua parte mais significativa; e, finalmente, cria espaços de indeterminação, ambiguidade e criatividade que o seu público poderá explorar.
Um exemplo famoso (e fumoso…) de elipse é a que encontramos na sequência de abertura de Vertigo (1958), de Alfred Hitchcock. Tudo começa, coerentemente, muito acima do chão. Um criminoso foge para um telhado que domina uma altura imensa. Dois polícias estão no seu encalço e um deles é James Stewart. Ouvem-se tiros. Quando Stewart escorrega e se agarra por um triz a uma calha, o colega tenta auxiliá-lo mas cai para a sua morte. Tudo indica que Stewart vai seguir o mesmo destino: a chapa metálica que o segura dá sinais de ceder, mas um corte súbito transporta-o logo de seguida para o conforto da casa de Midge. A elipse é das mais enigmáticas, porque nunca nos é mostrado como é que o protagonista se salvou da morte. De certo modo, ele é o primeiro a voltar «d’entre les morts» (título do livro de Boileau e Narcejac que inspirou o filme) e a sua sobrevivência pertence à ordem do onírico. Tudo se passa como num sonho, como no despertar daqueles pesadelos frequentes em que sonhamos que vamos a cair. No final do filme, Stewart voltará a estar suspenso sobre o abismo, sem sabermos se irá cair ou novamente mergulhar na loucura.
Uma das razões que fez de Cães Danados (1992), de Quentin Tarantino, um heist movie tão surpreendente é a grandiosa elipse que está ao centro desta história sobre lealdade e um assalto gorado. Em nenhum momento nos é mostrado o roubo dos diamantes, mas unicamente aquilo que se passa antes e depois: o recrutamento dos gatunos, a fuga para o armazém ou a dramática execução de Mister Orange. Tarantino explica porquê: «alguns realizadores gostam de mostrar tudo. Eles não querem que o público especule sobre o que quer que seja; está tudo lá. Eu não penso assim. Eu já vi tantos filmes que me dá um gozo enorme manipulá-los. Cerca de nove em cada dez filmes que vemos, dão logo a entender nos seus primeiros dez minutos que tipo de filme é que são e o público apercebe-se no seu subconsciente disso e começa a virar para a esquerda quando o filme ainda se está a preparar para virar à esquerda; eles prevêem aquilo que vai acontecer a seguir. E o que eu gosto de fazer é utilizar essa informação contra eles.»
O grande David Mamet sempre gostou de fazer filmes sobre filmes e em Manobras na Casa Branca (1997) escolheu falar sobre os produtores. Tradicionalmente, eles eram meros assalariados aos quais se atribuíam projectos, orçamentos, elencos e equipas técnicas, mas o moderno Dustin Hoffman destas Manobras é muito mais do que isso: uma mistura de empresário astuto, contabilista prudente, diplomata flexível e criador artístico visionário. Em suma, um filho da mãe esperto. No final, ele consegue salvar a candidatura do Presidente dos Estados Unidos, mas ainda não está satisfeito: «Acha que eu fiz isto tudo pelo dinheiro? Eu fiz isto pelo reconhecimento! […] Eu sou o produtor, se não fosse por mim não se teria conseguido nada. Eu é que fiz tudo e num tempo recorde. Veja isto. Isto é uma porra de uma fraude e parece 100 % verdade. É o meu melhor trabalho de sempre, porque é tão honesto. Pela primeira vez na minha vida, eu não vou ser intrujado. Eu quero o meu crédito!» Claro que Hoffman nunca chegará a obter o crédito e a cena seguinte conduz-nos de um salto às suas exéquias fúnebres. A morte do protagonista deverá ter sido tudo menos tranquila, mas, felizmente para nós, Mamet não quis sujar as mãos e a sua elipse final poupar-nos-á a esse espectáculo penoso.
Um exemplo famoso (e fumoso…) de elipse é a que encontramos na sequência de abertura de Vertigo (1958), de Alfred Hitchcock. Tudo começa, coerentemente, muito acima do chão. Um criminoso foge para um telhado que domina uma altura imensa. Dois polícias estão no seu encalço e um deles é James Stewart. Ouvem-se tiros. Quando Stewart escorrega e se agarra por um triz a uma calha, o colega tenta auxiliá-lo mas cai para a sua morte. Tudo indica que Stewart vai seguir o mesmo destino: a chapa metálica que o segura dá sinais de ceder, mas um corte súbito transporta-o logo de seguida para o conforto da casa de Midge. A elipse é das mais enigmáticas, porque nunca nos é mostrado como é que o protagonista se salvou da morte. De certo modo, ele é o primeiro a voltar «d’entre les morts» (título do livro de Boileau e Narcejac que inspirou o filme) e a sua sobrevivência pertence à ordem do onírico. Tudo se passa como num sonho, como no despertar daqueles pesadelos frequentes em que sonhamos que vamos a cair. No final do filme, Stewart voltará a estar suspenso sobre o abismo, sem sabermos se irá cair ou novamente mergulhar na loucura.
Uma das razões que fez de Cães Danados (1992), de Quentin Tarantino, um heist movie tão surpreendente é a grandiosa elipse que está ao centro desta história sobre lealdade e um assalto gorado. Em nenhum momento nos é mostrado o roubo dos diamantes, mas unicamente aquilo que se passa antes e depois: o recrutamento dos gatunos, a fuga para o armazém ou a dramática execução de Mister Orange. Tarantino explica porquê: «alguns realizadores gostam de mostrar tudo. Eles não querem que o público especule sobre o que quer que seja; está tudo lá. Eu não penso assim. Eu já vi tantos filmes que me dá um gozo enorme manipulá-los. Cerca de nove em cada dez filmes que vemos, dão logo a entender nos seus primeiros dez minutos que tipo de filme é que são e o público apercebe-se no seu subconsciente disso e começa a virar para a esquerda quando o filme ainda se está a preparar para virar à esquerda; eles prevêem aquilo que vai acontecer a seguir. E o que eu gosto de fazer é utilizar essa informação contra eles.»
O grande David Mamet sempre gostou de fazer filmes sobre filmes e em Manobras na Casa Branca (1997) escolheu falar sobre os produtores. Tradicionalmente, eles eram meros assalariados aos quais se atribuíam projectos, orçamentos, elencos e equipas técnicas, mas o moderno Dustin Hoffman destas Manobras é muito mais do que isso: uma mistura de empresário astuto, contabilista prudente, diplomata flexível e criador artístico visionário. Em suma, um filho da mãe esperto. No final, ele consegue salvar a candidatura do Presidente dos Estados Unidos, mas ainda não está satisfeito: «Acha que eu fiz isto tudo pelo dinheiro? Eu fiz isto pelo reconhecimento! […] Eu sou o produtor, se não fosse por mim não se teria conseguido nada. Eu é que fiz tudo e num tempo recorde. Veja isto. Isto é uma porra de uma fraude e parece 100 % verdade. É o meu melhor trabalho de sempre, porque é tão honesto. Pela primeira vez na minha vida, eu não vou ser intrujado. Eu quero o meu crédito!» Claro que Hoffman nunca chegará a obter o crédito e a cena seguinte conduz-nos de um salto às suas exéquias fúnebres. A morte do protagonista deverá ter sido tudo menos tranquila, mas, felizmente para nós, Mamet não quis sujar as mãos e a sua elipse final poupar-nos-á a esse espectáculo penoso.
2005-03-17
Um tiro no escuro
O realizador Leonel Vieira acaba de estrear Um tiro no escuro (2005), que conta com um elenco notável: Joaquim de Almeida, Vanessa Machado, Filipe Duarte, Miguel Borges, João Lagarto e, claro está, o grande Ivo Canelas. Que maravilha de actor, este Canelas! No nosso filme O Porteiro, o Ivo interpretou com todo o brilhantismo um protagonista indeciso e sentimental. Agora, a comprovar a sua versatilidade espantosa, ele é o Brocas, um ex-presidiário oleoso, charrado e movido ao som dos Mão Morta. Ah, e esperem só pela surpresa que ele vos reserva lá mais para o fim do filme!
Depressão
Para mim, ao contrário do que preconizavam os poetas românticos, um texto deve sair de uma assentada e na sua forma definitiva, porque só assim se escreve com verdade. Detesto fazer correcções ou aditamentos às minhas crónicas. As emendas são uma vergonha e representam uma capitulação miserável perante a minha falta de talento.
2005-03-16
Stephen King
Uma paragem obrigatória no roteiro da blogosfera: as Estações Diferentes, do português Stephen King.
2005-03-14
Os lisboetas
Um dos traços comportamentais mais marcantes dos lisboetas é a sua elegância no vestir. O verdadeiro alfacinha não esquece a sua camisola da Burberry's, a camisa Lacoste ou os sapatinhos italianos e seja em que circunstância for: no passeio de domingo, no hipermercado, no shopping. No café, eis-me aqui de calções e sapatilhas cambadas, como um macaco jogado no meio dos dandies da capital.
2005-03-11
2005-03-08
Os críticos
Os críticos de cinema portugueses são francamente maus. Quase todos são seres pedantes, ignorantes da história do cinema e desconhecedores do que são os bastidores de um filme. Muitos escrevem sem brilho e objectividade. Outros ainda, menosprezam quase tudo o que seja produzido em Portugal, porque só é bom aquilo que é estrangêro. Claro que também há excepções, como os sempre excelentes e sabedores João Lopes, Lauro António e Bénard da Costa, além de vários blogues cinéfilos de enorme interesse, mas a maioria das coisas que lemos na imprensa dita tradicional estão muito abaixo do medíocre. Todos os que conhecem as redacções dos nossos jornais, sabem como é que as coisas se passam: «se não sabes fazer nada, vais para a crítica de cinema». É pena, pois a crítica não é uma figura menor e a sua influência junto do público está longe de ser despicienda.
Escrever uma crítica de cinema não é uma tarefa simples e as dificuldades começam com a complexidade do seu objecto: os filmes. Afinal, do que devemos falar quando falamos de um filme: o argumento? A montagem? Os actores? Mais: apesar de os puristas limitarem a crítica aos aspectos formais e a investigação académica às implicações culturais, o ponto ideal estará algures entre esses dois extremos. Tudo visto, teremos de concordar com Jean Cocteau quando afirmava que a musa do cinema «é excessivamente rica». O crítico deve começar por traçar uma estratégia de abordagem e seleccionar aquilo que lhe interessa de entre toda esta riqueza; aliás, o termo crítica deriva do verbo grego krinõ, que significa precisamente separar, distinguir, julgar. Depois, há que integrar com criatividade e sentido aquilo que se escolheu.
Outra particularidade está no carácter pragmático do cinema. Um filme é um empreendimento que resulta do encontro de forças muito diversas – produção, tecnologia e distribuição – e o crítico deve por isso munir-se de cuidados acrescidos. Nenhum filme é mau ou bom por causa das suas limitações de orçamento, mas é necessário ajustar expectativas: não é o mesmo julgar uma grande produção de Hollywood e um pequeno filme independente. No caso das produções africanas ou sul-americanas, o seu aspecto rudimentar poderá ser tanto um efeito secundário das dificuldades orçamentais quanto uma afirmação ideológica consciente e deliberada. O caso ainda recente do excelente filme angolano O Herói (2004), de Zé Zé Gamboa, foi expressivo: muitos críticos da nossa terra torpedearam a obra com toda a espécie de adjectivos desagradáveis, enquanto que lá fora, o filme acumulou prémios. Porque a versão exibida cá e lá foi rigorosamente a mesma, temos de concluir que os nossos críticos erraram e não conseguiram compreender a importância (que é coisa substancialmente diferente de gostar ou não gostar) desta primeira longa-metragem angolana.
Mas não basta compreender. Na sua obra-prima A Noite Americana (1973), Truffaut fala da distância abissal entre a idealização de um filme e a concretização dessa ideia; o mesmo se pode dizer da escrita sobre cinema, pois as boas ideias não são suficientes, é preciso saber expressá-las bem. Ora, a crítica é um texto caracteristicamente argumentativo que se dirige ao grande público consumidor de filmes; é isso que a distingue de outras formas de análise do cinema, como o ensaio crítico ou o ensaio teórico. O público privilegiado de uma crítica é por isso composto não por estudiosos, mas leigos que vêem os filmes por gosto. Insensíveis a esta evidência, os críticos que lemos minam os seus textos com um palavreado excessivamente técnico, muitas vezes sem qualquer rigor e de forma ininteligível para a generalidade dos leitores.
Escrever uma crítica de cinema não é uma tarefa simples e as dificuldades começam com a complexidade do seu objecto: os filmes. Afinal, do que devemos falar quando falamos de um filme: o argumento? A montagem? Os actores? Mais: apesar de os puristas limitarem a crítica aos aspectos formais e a investigação académica às implicações culturais, o ponto ideal estará algures entre esses dois extremos. Tudo visto, teremos de concordar com Jean Cocteau quando afirmava que a musa do cinema «é excessivamente rica». O crítico deve começar por traçar uma estratégia de abordagem e seleccionar aquilo que lhe interessa de entre toda esta riqueza; aliás, o termo crítica deriva do verbo grego krinõ, que significa precisamente separar, distinguir, julgar. Depois, há que integrar com criatividade e sentido aquilo que se escolheu.
Outra particularidade está no carácter pragmático do cinema. Um filme é um empreendimento que resulta do encontro de forças muito diversas – produção, tecnologia e distribuição – e o crítico deve por isso munir-se de cuidados acrescidos. Nenhum filme é mau ou bom por causa das suas limitações de orçamento, mas é necessário ajustar expectativas: não é o mesmo julgar uma grande produção de Hollywood e um pequeno filme independente. No caso das produções africanas ou sul-americanas, o seu aspecto rudimentar poderá ser tanto um efeito secundário das dificuldades orçamentais quanto uma afirmação ideológica consciente e deliberada. O caso ainda recente do excelente filme angolano O Herói (2004), de Zé Zé Gamboa, foi expressivo: muitos críticos da nossa terra torpedearam a obra com toda a espécie de adjectivos desagradáveis, enquanto que lá fora, o filme acumulou prémios. Porque a versão exibida cá e lá foi rigorosamente a mesma, temos de concluir que os nossos críticos erraram e não conseguiram compreender a importância (que é coisa substancialmente diferente de gostar ou não gostar) desta primeira longa-metragem angolana.
Mas não basta compreender. Na sua obra-prima A Noite Americana (1973), Truffaut fala da distância abissal entre a idealização de um filme e a concretização dessa ideia; o mesmo se pode dizer da escrita sobre cinema, pois as boas ideias não são suficientes, é preciso saber expressá-las bem. Ora, a crítica é um texto caracteristicamente argumentativo que se dirige ao grande público consumidor de filmes; é isso que a distingue de outras formas de análise do cinema, como o ensaio crítico ou o ensaio teórico. O público privilegiado de uma crítica é por isso composto não por estudiosos, mas leigos que vêem os filmes por gosto. Insensíveis a esta evidência, os críticos que lemos minam os seus textos com um palavreado excessivamente técnico, muitas vezes sem qualquer rigor e de forma ininteligível para a generalidade dos leitores.
Rasputine
«É óbvio que sou um ladrão. Mas aquilo que roubo, gasto. Faço o dinheiro circular. Há montes de pessoas que vivem graças áquilo que eu gasto depois de um roubo.»
Marina Seminova
«Sim, dancei e bebi com os meus homens. De vez em quando, é preciso sabermos divertir-nos. Sobretudo se, depois, podemos rezar para obter o perdão do Senhor.»
2005-03-07
Victor Espadinha
A programação da Rádio Radar (97.8) está ainda melhor graças à presença assídua de Victor Espadinha, o nosso maior galanteador. Segundo Espadinha, para quem desejo é sinónimo de potência, os segredos para uma relação de sucesso são três: respeito mútuo, saber esconder o ciúme e não confessar as infidelidades.
All That Jazz
«Se eu fosse Deus – e às vezes penso que sou, depende daquilo que se está a fumar… Ok, se eu fosse Deus, toda a gente vivia eternamente. Enfim, podia haver uma ou duas excepções, como o meu agente, que me enfiou nesta espelunca. Sabem, a morte está na moda. Livros, artigos de revista, programas de televisão, o Ken e a Barbie com um pacto suicida. Há uma senhora que escreveu um livro, a Dra. Kübler-Ross, com hífen. Essa senhora, sem o benefício da própria morte, dividiu o processo da morte em cinco fases: ira, negação, negociação, depressão e aceitação. Parece uma firma de advogados judeus: ‘Bom dia, daqui fala Ira, Negação, Negociação, Depressão & Aceitação, em que lhe posso ser útil?’»
2005-03-02
Prazer Inculto
Um dos blogues mais inspirados de toda a Internet acaba de completar dois anos de idade: o Prazer Inculto, do nosso Possidónio Cachapa. Parabéns, Mestre!
2005-03-01
O Código Da Vinci na RTP1
A controvérsia em redor de O Código Da Vinci continua acesa e a RTP1 decidiu dedicar-lhe todo o serão de ontem, com um debate e um documentário sobre o tema. O documentário foi esclarecedor e uma boa síntese da questão de Jesus e Maria Madalena. Já o debate que se seguiu, com Carreira das Neves, Anselmo Borges, Helena Barbas e João César das Neves, foi menos objectivo. Todos os quatro participantes disseram o mesmo e falaram a uma só voz contra «os perigos» do romance de Dan Brown - excepção feita a uma nesga de controvérsia a respeito do estatuto da mulher no seio da Igreja Católica. Mesmo assim, sobreviveram algumas ideias importantes: Borges criticou a misoginia da Igreja e Helena Barbas falou doutamente sobre a erradicação sistemática do Feminino dos textos sagrados.
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