2006-06-26

Tempo de Viver

A telenovela Tempo de Viver marca o regresso de Rui Vilhena. Conheci pessoalmente o conceituado argumentista em Fevereiro de 2006 e guardo a imagem de um profissional exigente, íntegro e inteligentíssimo. É ele o grande responsável pelo sucesso (de público e não só) desta nova aposta da TVI: se os realizadores são os verdadeiros autores do cinema, já a ficção televisiva é o território por excelência dos argumentistas. O próprio patrão José Eduardo Moniz salientou publicamente a qualidade do texto de Tempo de Viver e com toda a razão. Resta saber o que torna a escrita do Vilhena tão eficaz e sedutora.

O primeiro objectivo de qualquer texto dramático (seja em televisão, teatro ou cinema) consiste na obtenção e manutenção da atenção do espectador através do suspense. Só quando este objectivo for conseguido, é que o autor poderá ambicionar finalidades mais nobres, como a transmissão de conhecimentos ou a promoção de uma ideologia. A questão é saber como pode um autor agarrar os seus espectadores. A este respeito, os teóricos da arte dramática distinguem três grandes modalidades de suspense: o que é suscitado pela questão principal (quem é o assassino?), pelas sequências e cenas (o fantasma vai ou não aparecer perante Hamlet?) e pelos diálogos. Vale a pena analisarmos esta última modalidade, já que as telenovelas do Rui Vilhena são famosas pela excelência dos seus diálogos.

A brevidade é a primeira condição de um bom diálogo dramático. Uma fala em telenovela deve dizer o máximo com o mínimo de palavras, porque a tv é um meio eminentemente visual. Os diálogos escritos pelo Rui Vilhena fazem um excelente uso daquilo que no teatro clássico grego se designava por stikomythia ou a troca enérgica de falas breves. Nada de floreados, redundâncias inúteis ou longos monólogos.

Importa ainda que os diálogos sejam claros. A acção mais violenta não suscitará qualquer impacto ou poderá mesmo provocar um enfado profundo, se os espectadores não compreenderem quem são, o que fazem e o que dizem as personagens. Aristóteles falava em «clareza sem baixeza». Esta necessidade de clareza é ainda mais pertinente num projecto como uma telenovela, já que se pretende atingir o maior número possível de espectadores e de todos os estratos sócio-culturais. Em Tempo de Viver, as personagens repetem à exaustão os nomes dos seus interlocutores para que ninguém perca pitada.

A condição mais importante de um diálogo com suspense é a dosagem da informação nas quantidades e nos momentos certos. Recordemos, por exemplo, como a Rosa do Canto nada diz de início à Margarida Vila-Nova (fabulosa na pele da vilã!) sobre o que sabe a respeito da prisão da mãe Alexandra Lencastre: o precioso trunfo é guardado para mais tarde, de modo a que a revelação da verdade possa produzir o efeito de uma bomba atómica. A minúcia do Vilhena chega ao ponto de reservar as informações mais relevantes para o final das falas, de modo a que não se desperdicem palavras e a atenção dos espectadores não se perca a meio.