2006-05-08

Margarida Rebelo Pinto


Gosto da Margarida Rebelo Pinto. Há boas razões para gostar da senhora, quanto mais não seja porque foi ela a escritora que fez com que os portugueses redescobrissem o gosto pelos livros. E não são apenas os portugueses: a nossa escritora mais comercial também já foi publicada em países como a Alemanha, o Brasil, a Espanha, a Bélgica e a Holanda. Mesmo assim, há sempre quem não goste e um dos críticos mais severos é o João Pedro George, autor do blogue Esplanar e do livro Couves & Alforrecas: Os Segredos da Escrita de Margarida Rebelo Pinto. Já todos conhecemos o texto e as razões do famoso sociólogo, que fundamenta o seu desapreço pela autora numa pitoresca acusação de auto-plágio. George é enérgico e eloquente no seu texto, mas não tem razão nenhuma naquilo que diz.

Toda a argumentação de João Pedro George assenta nesta ideia simples: os livros da Rebelo Pinto repetem-se e por isso são maus – ou são «sub-literatura», para usar a sua expressão. Mas a verdade é que os escritores, maus e bons, sempre se repetiram e imitaram uns aos outros. A teoria da literatura codificou esta realidade em termos como alusão literária, intertextualidade ou re-utilização, os quais, na essência, dizem apenas isto: a repetição, em literatura, é algo de normal e até inevitável. Isto não é, obviamente, nenhuma desculpabilização do plágio. Significa apenas que é ridículo formular juízos sobre obras literárias só com base em pretensas auto-imitações e que alguns obsessivos da originalidade não sabem o que estão a dizer ou então têm alguma na manga.

Seja como for, estamos a falar de generalidades, porque a Margarida Rebelo Pinto é, na realidade, uma autora original. É um completo absurdo dizer, como fez o George, que «as personagens, as situações, os temas e a estrutura narrativa são sempre os mesmos». Goste-se ou não, a abrangência da escrita dela é inegável e são variadíssimos os géneros e formas literárias a que a escritora emprestou a sua sensibilidade e a sua argúcia: dos romances polifónicos como Alma de Pássaro ou Pessoas Como Nós até às crónicas jornalísticas, das peças de teatro à longa carta de amor de Diário da Tua Ausência, estamos perante uma criadora que se reinventa a cada nova obra e sempre com inegável êxito.

Resta saber qual é o segredo do sucesso da Margarida Rebelo Pinto. Desde logo, a autora teve o mérito de encontrar um conjunto de temas suficientemente importantes para interessarem a toda a gente: o amor («não quero desistir do amor»), a solidão, a condição feminina. Os seus ambientes luxuosos – que a Rebelo Pinto, como grande jet-setter que é, conhece lindamente – são povoados por príncipes e princesas que conduzem Audis, vestem roupas caras e fazem compras em Nova Iorque. Isto contagia as narrativas da Rebelo Pinto com um encantamento semelhante ao dos contos de fadas – recordemos as abundantes alusões aos irmãos Grimm ou até a supremacia das suas mulheres, pois nos contos maravilhosos proliferam as personagens femininas cujas virtudes e qualidades são recompensadas. Mas a autora introduz duas novidades: a espantosa mobilidade social dos protagonistas, pois até as personagens de condição modesta conseguem ascender meteoricamente a essa realeza; e o desprezo pelos finais felizes, já que os problemas, como na vida real, só começam verdadeiramente depois do casamento.

23 comentários:

dermot disse...

Acho que é a primeira vez em que discordo com um texto neste blogue.
Sinceramente, sou dos que consideram a escrita da Margarida Rebelo Pinto inferior, não só pela forma como também pelo conteúdo.
Confesso que nunca li nenhuma das suas obras até ao final, mas o seu estilo é demasiado fútil e pueril. A repetição dos temas não me incomoda, mas faz-me espécie como é que um escritor consegue repetir páginas inteiras, letra a letra. Por isso, também não concordo quando dizes que ela consegue se reinventar.

Flávio disse...

Tudo bem Dermot, é a tua opinião e está bem fundamentada. Mas acho que em vez de alguns pseudo-intelectuais e críticos de vinte patacos à dúzia (não é, obviamente, o teu caso nem do João Pedro George) andarem a criticar a senhora e a arremessar-lhe os piores insultos, deveriam antes tentar ler os seus livros e compreender porque vendem tão bem.
Coisa que, até hoje, nenhum crítico fez.

a miúda disse...

Já algum tempo que não andava por aqui...
Tal como o dermot, não concordo nada com o texto que escreveste.
Sobre a MRP e este assunto já escrevi algumas coisas no meu blog, e continuo a pensar exactamente da mesma forma.
Quanto ao porque é que ela vende tanto, acho que isso se explica de várias formas, uma delas é a enorme publicidade/marketing que tem através dos amigos "importantes/influentes" na sociedade portuguesa, como é o caso do Herman José (que quer se goste ou não do mesmo).
A escrita dela é de facto fácil de ler, e talvez tenhas razão na parte dos contos de fadas, a verdade é que a maioria das pessoas gosta de sonhar e talvez muitas sonhem ter a vida que ela descreve.
Mas sinceramente, depois de ter lido o "Sei lá" que comprei para passar o tempo jurei que nunca mais leria nada da senhora, porque de facto não gostei mesmo nada do livro, achei o enredo idiota e básico e em vez de acabar o livro com uma certa satisfação, como acontece com alguns livros leves, que leio para desanuviar, ou sonhar, um pouco com esse isso não aconteceu.
Outra coisa que acho verdadeiramente inadmíssivel são alguns dos erros ortográficos e gramaticais que os livros têm, embora a culpa não seja apenas dela, mas também da editora, e os parágrafos e páginas iguais.
É obvio que um escritor terá sempre tendência a repetir-se e a passar ideias semelhantes, afinal faz parte da sua coerência como pessoa. Mas exactamente iguais? Dá que pensar, e a mim faz-me pensar que realmente a senhora não tem nada a dizer.
No entanto, gostos não se discutem. E ainda que ache que seria preferível que os portugueses lêssem outras coisas, a verdade é que não tenho a certeza se de facto a MRP não terá conseguido o feito, de que as pessoas de facto redescobrissem o prazer de ler...

dermot disse...

Concordo contigo Flávio, quando dizes que muita gente critica sem saber porquê. Faz parte do senso comum do "dizer mal por dizer". Já estamos todos habituados...
Quanto ao facto dos livros da MRP venderam tanto, tal acontece, como referiu o nunf, à enorme publicidade que se faz, nomeadamente à publicidade de hipermercado. E aqui dava para escrever quase uma tese...

Flávio disse...

Nunf, nenhuma campanha de marketing conseguiria sustentar o êxito de uma escritora por tanto tempo: há anos que a MRP está de pedra e cal nos tops e assim vai continuar por muitos mais. Ao contrário do que é comum ler-se na imprensa, ela não é nenhuma fenómeno de moda.

Resta analisar o porquê desse sucesso, coisa que os nossos críticos ainda não fizeram. Aliás, a MRP tem toda a razão quando se queixa da falta de atenção dos críticos portugueses. Só um exemplo: nas universidades americanas, além dos autores do cânone, estudam-se, sem os preconceitos idiotas do costume, criadores pop como ela (letras da madonna, romances da J. Collins, etc)

Isa disse...

a margarida rebelo pinto vende não é pq tem amigos influentes e mta publicidade. a mrp vende pq trouxe para portugal um tipo deescrita que já existe há anos e anos em inglaterra e que desatou a vender como azeitonas. a escrita da MRP é bem pior, e nem falo nos erros ortográficos pq isso mtas xs e culpa do revisor, pq n tem história, o conteúdo é solto, sem trama ou enredo. Dêem uma espreitadela em autores como: mike gayle, tony parsons, e vão ver se as "ideias" n são sacadinhas à letra. com uma diferença, estes gajos têm mta graça a escrever e n têm falhas de personagem. os livros são light mas n são assim tanto qto isso. e mto menos são básicos. no caso do mike gayle, por exemplo, ele escrevia há anos numa revista antes de publicar o primeiro livro. e escrevia sb quê? relações! a mrp simplesmente n tem bagagem para escrever como eles. mas ganha a vida assim, deixai-a, e pôs sim mta gente a ler.

pedro oliveira disse...

Exitei (como diria Margarida Rebelo Pinto [M.R.P]) antes de iniciar este comentário.

Nunca li (nem tenciono ler) nenhum livro da senhora.

Tentei ler algumas crónicas no DNA e cada uma era pior que a outra, ora se uma pessoa não consegue escrever uma crónica, como conseguirá escrever um livro?

Enquanto «escritora» (recordo os pedaços de muitas crónicas que fui tentando ler) não possui complexidade, a temática era, invariavelmente, a mesma. Classe média/alta amores e traições e empregadas domésticas, são estes os horizontes da «escritora».

Sem querer ofender a política italiana diria que [M.R.P]está para a literatura como Cicciolina está para a política, ambas se aproveitam da imagem para vender um determinado produto.

Ao argumento: Pôs o país a ler; respondo com este: Zé Cabra pôs o país a ouvir música... e daí?

Flávio disse...

Dois comentários breves:

a) ISA, não é só a Rebelo Pinto, porque 99,9% dos escritores escrevem sobre relações humanas.

b) O exemplo do Zé Cabra não tem razão de ser - ele é um fenómeno da moda, a Margarida Rebelo Pinto já escreve há anos.

Flávio disse...

O último comentário do R. Cardoso sobre os "dramas inverosímeis" fez-me recordar um outro comentário jocoso do grande Hitchcock a respeito do que ele chamava "os nossos amigos verosimilhantes". Hitch dizia que se quisesse fazer filmes (mas o mesmo se poderia aplicar aos livros) 100% verosímeis, teria de realizar documentários.

É verdade que há muita inverosimilhança nos livros da Margarida Rebelo Pinto, mas há também uma capacidade de observação notável da autora. Quando no futuro se fizerem estudos sobre a vida quotidiana em Portugal, os livros dela serão uma fonte preciosa de infos.

Anónimo disse...

O que é um romance polifónico ?

Flávio disse...

Romance polifónico = pluralidade de vozes narrativas.

O Genette é o grande teorizador destes conceitos, encontras facilmente os livros dele em qualquer livraria.

Anónimo disse...

Faço meus os restantes comentários que não concordam com o teu texto Flávio. Acho-a uma escritora muito fraca. Escreve mal e sim, já tentei ler mas é francamente sofrível. Não misturo esse sucesso como outros, como Dan Brown, que são comerciais competentes.
Não é verdade que cada seu livro seja um 'sucesso', enfim, é relativo. MRP veio abrir um filão novo que será explorado e esgotado e isso explica a diminuição das vendas. Quando ela surgiu não havia Dan Browns e Harry Potters ainda, o mercado da tradução e do marketing "internacional" não estava tão desenvolvido. Já nem falo nas clones e nos clones de MRP que se jogaram ao filão, e de formas muito mais desonestas. De certa forma, até Manuel Maria Carrilho a imitou.

As críticas de João PEdro George são certeiras. Ela fez copy paste de páginas e trechos inteiros.
E sim, li crónicas dela (como as do Jornal O Metro) e não as acho, enfim, muito piores do que outras. Mas são medíocres. Não tenho absolutamente nada contra o "comercial", pelo contrário, e concordo que ela levou a leitura a pessoas que de outra forma não liam nada, devolveu algum glamour à profissão de escritor em portugal, dempertigou o meio, e fomentou um mercado mais rico. É com toda a sinceridade que digo que espero que ela continue a escrever e que tenha sucesso.

Flávio disse...

Obrigado pelo excelente comentário lb - essa comparação ao Carilho é de antologia! :)) Quanto às críticas do JPG e aos auto-plágios, deixo aqui um exemplo que dá que pensar: o André Breton (esse mesmo, o francês e papá do surrealismo) em L'amor fou copiou trechos inteiros de um outro texto seu, Tournesol. Será auto-plágio? Será que o Breton também é um "sub-autor"?

Lourenço Bray disse...

O André Breton era dadaísta, não sei, aquilo tinha muito a ver com "colagens" não tinha? :)

maria disse...

Desta vez não concordo com o flavio. Se fossemos medir o talento da MRP pelo número de vendas então também teríamos de dizer que o melhor programa da TV são oa Morangos com Açúcar. São a face dos tempos que correm

Anónimo disse...

cof cof cof, poxo? tou abismada. tanta gente preocupada com o bem dos outros. que all truísmos!!!

carne disse...

Olá metópolis, há que tempos!... Passei por aqui por saudades, para saber como andas. Mas quando li este post percebi logo que andas menos bem. Estás completamente equivocado em relação à qualidade literária da MRP. E trazeres para este debate essas citações que vens trazendo é coisa ridícula. O tal crítico de-que-agora-não-me-lembro-o-nome disse toda a verdade. Pecou só pelo sarcasmo exagerado (talvez involuntário) que permite, a certa altura, fazer da MRP uma vítima, coitadinha. Essa senhora é uma óptima vendedora mas uma péssima escritora.

Flávio disse...

Olha o Senhor Carne, bem-vindo!

Anónimo disse...

Realmente, o João Pedro George, pseudo-critico, é da maior merda que há no País. Precisa colar-se aos autores famosos para se fazer notar, mas não se apercebe da podridão que essa atitude representa. Nem quero imaginar o que é que os alunos dele aprendem nas aulas: a venerar o professor por se achar o maior? É assim que ele estimula o seu ego gigante?
Pobre de espírito, é o que é.

Anónimo disse...

Pior que o João George só mesmo o Duarte Pio www.reifazdeconta.com

Anónimo disse...

Os livros desta pseudo-tudo vendem tão bem porque fútile fácil é o que vende atualmente, num Portugal estupidificado pela pseudo-educação, media e ideiais da modernidade (progresso e status). Os livros desta pseudo vendem tão bem como os discos do Tony Carreira, os oprogramas do Goucha ou do Baião, os reality shows, a revista Maria e afins... Os livros desta senhora vendem tão bem porque estão revestidos de ideias fúteis e baseados em status... Os livros e j+a agora as crónicas (idiotas) desta pseudo ualquer coisa vendem tão bem porque o seu cérebro está cheio de idiotices!

MN disse...

Bom, eu vou entrar na discussão dos comentadores que não são anónimos.
Uma coisa manter-se no top de vendas não quer dizer que seja melhor que outras.

Eu acho sinceramente que fazem um excelente tipo de texto argumentativo: generaliza-se para se ilustrar e defender uma tese. Mas acho um bocado estranho alguém comparar um individuo ( o Breton) usando uma obra individual em que a colagem de trechos de outro seu livro é usado como um recurso para aquele livro. E não como método regular para todos os livros. Depois, sinceramente, se a MRP tivesse teorizado e escrito obras da profundidade de pensamento como as outras do Breton, ainda fazia sentido comparar. Mas, convenhamos... esta comparação está ao nível de refutar o argumento da popularidade dizendo " eu como mais pão e arroz do que gambas e santola, logo o papo-seco é muitissimo superior ao marisco. Mantem-se no top das vendas há décadas e a diferença de consumos é brutal".

Pessoalmente, não gosto nem de MRP nem do JPG. Ambos usam o mediatismo, ambos têm uma individualidade mto particular e um grau suficientemente elevado de egocentrismo.

Discordo totalmente da influência da MRP na edição, em Portugal, de Harry Potters e de Dan Brown.
Mas se é para comparar com textos ao nível literário ( ou de competência de escrita - que será um termo mais fácil para não desviar para a conversa de literatura erudita, séria ou popular), já antes da MRP havia um nicho de mercado especifico, que editava coisas como as dela, seja as traduções de Barbara Cartland, seja em versão francamente popular e graças a Deus mais económica para os leitores, de uns livrinhos da colecção Sabrina ( e outras), pequeninos e leves, com o tipo de coisas que ela escreve.
Dan Brown e Hary Potter surgiram porque graças a Deus nosso senhor ( lol), existe um fenómeno externo à MRP que é o marketing das editoras internacionais, as feiras e o sucesso de vendas que acompanha obras que, por serem populares nos seus países de origem, são adaptadas ao cinema, aumentando o interesse de uma outra parcela do publico, de ler o texto original.

Mas sinceramente, não gosto do tema. Só o acho tolerável quando bem escrito, ou trabalhado de uma forma mais original e que surpreenda.

Mas para ilustrar que até as autoras que são mais intelectuais também têm momentos mauzitos, lembro um Verão em que li 4 crónicas da Clara Ferreira Alves sobre os problemas de arranjar empregada doméstica. E, mesmo sendo Verão, perguntei-me por onde andava o Editor da Revista do Expresso para pagar com 600 contos mensais, aquele tema importantíssimo, aquele reflexão altamente interessante e enriquecedora para o comum dos leitores.

É que nem vinha uma única receita de como limpar melhor o pó ou um truque infalível de apagar uma nódoa. Para sempre....

XEF disse...



"A teoria da literatura codificou esta realidade em termos como alusão literária, intertextualidade ou reutilização..."

Engano gravíssimo, de palmatória!!!! A Literatura não confunde, jamais!, "alusão literária", " reutilização" ou, muito menos, "intertextualidade" com "redundância"!!!!! Quem confunde tudo é vossa excelência e nos tenta confundir a nós.
O que o Sr. está a dizer é que usar um copo plástico, sujo, vezes sem conta, uma a seguir à outra ( o copo vai ficando cada vez mais amarrotado e sujo) é a mesma coisa que o utilizar, lavar, colocar no escorredor e voltar a usar posteriormente. Já para não falar que, no caso do autoplágio, não há qualquer tipo de "intertextualidade" ou algo que o valha! Só se for texto com o próprio texto, ou seja, olhar para o mesmo umbigo duas vezes, fazer-lhe cócegas duas vezes e julgar que se tem uma visão e uma experiência mais enriquecida por ter olhado e feito cócegas duas vezes sobre a mesma coisa!
Quanto à qualidade da escrita de M.R.P., só uma coisa: cada um escolhe o que quer - uns escolhem caviar, outros escolhem sardinha em lata, dizendo ao estômago que é caviar! É do livre arbítrio de cada um! Nada mais!