2005-11-11

Casa Pia (iv)

A absolvição de Paulo Pedroso e Herman José pela Relação de Lisboa encerra mais um capítulo no processo da Casa Pia. Os desembargadores Rodrigues Simão, Carlos Sousa e Mário Morgado entenderam, por unanimidade, que não existem indícios suficientes da prática de crimes por estes arguidos, pelo que não se justifica que sejam levados a julgamento. E desta vez, o veredicto é definitivo. Apesar de alguma discordância no seio da nossa jurisprudência a respeito destes casos, a opinião dominante vai no sentido da impossibilidade de interposição de novo recurso: uma vez que o acórdão confirma uma decisão de um tribunal de primeira instância, inserindo-se assim no conceito jurídico designado por dupla conforme, já não é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Ainda é cedo para formular uma opinião segura a respeito do mérito desta decisão da Relação de Lisboa, porque os factos em discussão são muito complexos e o processo-crime principal está longe de acabar. Mesmo assim, podemos já adiantar duas ou três conclusões.

A absolvição de Herman José não terá surpreendido muita gente. Se no caso de Pedroso, o tribunal ainda falou de «uma dupla e insanável dúvida quanto à veracidade das imputações feitas ao arguido e quanto à pretendida inocência deste», já relativamente ao humorista não terão restado tantas dúvidas. Fica assim comprovada a sua inocência com toda a força inabalável que lhe confere o caso julgado e termina definitivamente um pesadelo de três anos. Para nós, seus amigos e admiradores, trata-se de uma decisão justa e do mais elementar bom senso. Aliás, Herman fez por merecê-la: quando todo o país espumava de raiva e se desdobrava em manifestações e marchas brancas, o arguido reagiu com a serenidade que é própria dos inocentes. Todos nos recordamos das palavras que proferiu à Imprensa, momentos após a sua notificação para a prestação de depoimento ao Ministério Público: «estarei lá com todo o gosto». Um belo exemplo de civismo!

O mesmo não se pode dizer dos magistrados do Ministério Público, que saem como os grandes derrotados desta decisão. Mas acabam vencidos apenas por culpa própria. Aquando da dedução da acusação a 29 de Dezembro de 2003, o Procurador-Geral da República Souto Moura, inchado como um pavão e ao arrepio de todo o bom senso, veio à Imprensa apregoar as virtudes do trabalho dos procuradores. Mais: afirmou que a sua magistratura faria «tudo», não para que fosse descoberta a verdade com imparcialidade, mas apenas para que a acusação fosse julgada procedente. A Relação de Lisboa vem agora dar a merecida resposta: entre outras críticas à condução da investigação, os desembargadores desvalorizaram o reconhecimento fotográfico de Pedroso, questionaram a sinceridade do depoimento de Carlos Silvino e falaram mesmo de testemunhos «inquinados» e «sugeridos» (não é muito difícil adivinhar por quem). Da próxima vez, esperemos que os procuradores sejam menos arrogantes e que o valente pontapé no rabo lhes tenha ensinado alguma coisa.

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